quarta-feira, 13 de julho de 2011

Quando acaba o amor...fica, o quê?

«O amor perfeito perde-se no tempo, caminha pelo passado, sente-se no presente, encaminha-se para o futuro e adormece na eternidade»
Não sei quem disse isto. Mas teve razão. O amor «perfeito» se é que existe, tem de ser assim, ou então é só mais um relacionamento humano (logo imperfeito), como os milhões que existem, feitos de um carrossel de subidas e descidas, rotinas e percalços, bons momentos (porque há sempre momentos) e geralmente uma ligação de raiz, edificada ao longo de décadas de convivência, de filhos gerados, de compromissos assumidos. Mas isto não é o amor perfeito, é o amor possível.

A paixão evolui para o amor, diz-se, não ficando bem claro porque é que um e outro não são almas gémeas. O amor vem da paixão, mas não é paixão…ou pode não ser. No entanto quando falamos de «amor» englobamos tudo. Fazemos da palavra o repositório de extremos, os extremos mais deliciosos da vida, porque nada é tão compensador ou gera tanto prazer mental e físico como uma relação de duas pessoas que se reconhecem mutuamente como únicas. Descobri um texto, no livro de crónicas de Margarida Rebelo Pinto, «A minha casa é o teu coração», que me tocou particularmente. É uma outra visão do amor. Não tanto no que tem de arco-íris, mas sobretudo no que tem de noite escura, quando acaba. Porque acaba. Ou pode acabar… e deixa um vazio maior que o universo.
Deixo partes desse texto. Merece ser lido. Chama-se:

«O que fica quando acaba o amor».
Devia haver um manual de instruções para acabar relações.
A verdade é que sabemos sempre começa-las, agarramo-nos aos inícios com a sabedoria dos mágicos, operamos transformações milagrosas em nós próprios e no objecto do nosso amor, de repente tudo nos parece fácil e grato, sentimo-nos com asas como albatrozes, nas nossas costas cresce uma capa encarnada e carregamos no peito o símbolo do Super-Homem,« tudo é divino e santo visto assim , o mundo não é um mundo, é um jardim», como diz Florbela Espanca.
Não há nada melhor do que começar uma relação. O novo é irresistível. Descobrem-se coincidências (…). É a primeira vez em tudo. Descobrimos o outro em nós e nós no outro. No início de todos os inícios sentimo-nos tão estupidamente felizes que seríamos capazes de morrer a seguir, porque achamos que atingimos o ponto máximo possível de felicidade. O pior vem a seguir, como dizia o Picasso: «bom mesmo é o inicio, porque a seguir começa logo o fim» E quando o fim chega, já é tarde demais para voltar atrás. É sempre tarde demais.

Isto do amor é mesmo uma coisa complicada, começa-se do nada, vive-se na ilusão que se tem tudo, mas o que fica quando o amor acaba é um nada ainda maior. E o pior, o pior é que na primeira oportunidade repetem-se os mesmos erros à espera de resultados diferentes, o que é uma boa definição de demência. E quem se considere imune a tais disparates e nunca tenha passado por estas avarias sentimentais, que atire a primeira pedra.

O Miguel Sousa Tavares escreveu, «primeiro parece fácil é o coração que arrasta a cabeça, a vontade de ser feliz que cala as dúvidas e os medos. Mas depois é a cabeça que trava o coração, as pequenas coisas que parecem derrotar as grandes, um sufoco inexplicável que aparece onde dantes estava a intimidade.» E pronto está tudo estragado. Acaba-se a festa, o delírio, o fogo de artifício, o sabor, a novidade, e onde vamos parar? Ao vazio. Ao abismo. Ao grande buraco negro dessa coisa horrível e inevitável que se chama depois, depois de se apagar a chama. E esta é a condição humana, doa a quem doer. Ou, então, a ironia da vida separa os amantes para sempre e o fim do amor é o início do mito do amor eterno.

Pedro e Inês foram sepultados de frente um para o outro, para que se pudessem ver no dia da ressurreição. Romeu e Julieta nunca mais se separaram no imaginário ocidental. Dante viveu para sempre ao lado de Beatriz, Penélope recuperou o seu guerreiro depois de vinte anos de espera.
O amor, esse mistério que antecede a vida e sobrevive à morte, reina como um tirano por cima de todas as coisas, mas poucos são os que o conseguem agarrar. (…) Talvez seja apenas uma invenção dos homens para fugir à morte. Ou talvez tenha outro nome na Bioquímica. Mas não podemos viver sem ele e, quando o perdemos, achamos que nunca mais o vamos conseguir encontrar.
Li. Registei. Não sei se aprendi alguma coisa, pois só se aprende o que nos marca a pele da alma como uma tatuagem, uma queimadura… uma cicatriz. Se calhar há coisas que devemos apenas saber, mas nunca comprovar…

Sem comentários: